Consciência Fonológica

  • Capacidade metalinguística que permite analisar e reflectir, de forma consciente, sobre a estrutura fonológica da linguagem oral (Cardoso-Martins, 1991; Gombert, 1991, 1993; Kamhi & Catts, 1991 cit. por Smit, 2004; Lane & Pullen, 2004; Pestun, 2005; Morais, 1989 cit. por Freitas, 2004; Nascimento, 2009; Schuele & Boudreau, 2008; Sim-Sim, 1998; Tunmer & Nesdale, 1985 cit. por Melo, 2006 );

  • A CF envolve a capacidade de identificar, isolar, manipular, combinar e segmentar mentalmente, e de forma deliberada, os segmentos fonológicos da língua (Alves, Freitas & Costa, 2007; Bernthal & Bankson, 1998 cit. por Smit, 2004; Ehri, 1989; Lopes, 2004; Nascimento, 2009);

  • Esta competência compreende dois níveis: (Byrne & Fielding-Barnsley, 1989 cit. por Nascimento, 2009)
    - Consciência de que a língua falada pode ser segmentada em unidades distintas: a frase pode ser segmentada em palavras, as palavras em sílabas e as sílabas em fonemas;
    - Consciência de que estas unidades se podem repetir em diferentes palavras;


  • Manifestações da CF: (Alves, Freitas & Costa, 2007; Freitas, 2004)
    - Nível implícito: sensibilidade para o sistema de sons da língua e para o conhecimento fonológico funcional, manifestando-se durante jogos espontâneos com os sons das palavras. Por exemplo: identificação de rimas por parte das crianças do pré-escolar;
    - Nível explícito: análise consciente dos sons das palavras, nomeadamente em actividades de isolamento de fonemas de uma palavra.

A CF expressa-se em dois níveis de crescente complexidade – consciência silábica e consciência fonémica – cujo treino deve respeitar esta ordem, antes e durante a iniciação à leitura e escrita (Alves, Freitas & Costa, 2007; Freitas, 2004).

A consciência fonológica e o processamento fonológico

  • O processamento fonológico é a capacidade de utilizar informações fonológicas para processar a linguagem oral e a escrita, englobando capacidades como a discriminação, memória e produção fonológicas, bem como a consciência fonológica (Avila, 2004 cit. por Nascimento, 2009; Lopes, 2004);
  • Operação mental, na qual o indivíduo recorre à estrutura fonológica ou a sons da língua oral, com a finalidade de aprender a descodificá-la no plano escrito (Figueiredo, 2006 cit. por Nascimento, 2009);
  • Envolve:

SSS- CF;
ssss- Discriminação fonológica:
capacidade de discriminar fonemas;
ssss- Memória fonológica: capacidade de memorizar palavras, sílabas e fonemas;
ssss- Produção fonológica: articulação das palavras e uso dos fonemas na fala.

(Santos & Navas, 2002 cit. por Nascimento, 2009)

Capacidades e Tarefas Metafonológicas

ssssExistem tarefas específicas, hierarquicamente organizadas (Tabela 1), através das quais é possível observar os diferentes níveis de CF adquiridos pela criança, nomeadamente:


ssss1. Noção de palavra
sssssssTambém denominada por consciência sintáctica, requer a capacidade de segmentar a frase em palavras, bem como, de organizá-las numa frase, de forma a dar-lhe sentido (Nascimento, 2009).



ssss2. Noção de rima
sssssssAs palavras rimam quando há semelhanças entre os sons desde a vogal ou ditongo tónico até ao último fonema da palavra, podendo abranger a rima da sílaba, a sílaba inteira ou mais do que uma sílaba.
Para identificar rimas, as crianças necessitam ter a capacidade de identificar sons finais das palavras (coração – melão) (Freitas, 2004). Esta capacidade é um nível natural e espontâneo da CF que integra precocemente as vivências das crianças através de músicas, histórias e brincadeiras (Freitas, 2004; Nascimento 2009).



ssss3. Aliteração
sssssssCapacidade de identificar ou repetir a sílaba ou fonema na posição inicial das palavras (Nascimento, 2009; Schuele & Boudreau, 2008).



ssss4. Consciência silábica
sssssssÉ a capacidade de segmentar palavras em sílabas, exigindo a execução de dois processos, a identificação e a discriminação de sílabas, sendo que o primeiro processo é facilitado aquando da produção isolada das sílabas (Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe, & Bandini, 2006; Nascimento, 2009; Sim-Sim, 1998).
sssssssA consciência silábica reflecte-se na capacidade de realizar actividades de segmentação, aliteração, síntese e manipulação (Nascimento, 2009).



ssss5. Consciência fonémica
sssssCapacidade para manipular e isolar as unidades sonoras que constituem a palavra (Lane & Pullen, 2004; Nascimento, 2009; Vale & Caria, 1997). Reflecte-se através da capacidade de segmentar, omitir ou substituir fonemas em palavras, bem como de evocar palavras com base no fonema inicial (Nascimento,s2009). Este nível requer ensino explícito pela introdução de um sistema alfabético e fornecimento de instruções acerca da estrutura da escrita alfabética (Lopes, 2004).



ssssO desempenho da criança, durante a execução de uma determinada tarefa, depende da exigência cognitiva da mesma e do nível linguístico que esta requer (Treiman & Zukowski, 1996 cit. por Freitas, 2004), uma vez que as actividades que avaliam a mesma capacidade podem exigir diferentes níveis de CF ou exigências cognitivas (Salles, Mota, Cechella, & Parente, 1999 cit. por Freitas, 2004).

ssssDesta forma, existem alguns critérios a ter em conta que podem tornar as tarefas mais simples ou mais complexas para as crianças, nomeadamente (Freitas, 2004):


Desenvolvimento da consciência fonológica

  • Inicia-se desde cedo (Bradley & Bryant, 1983; Carraher & Rego, 1984; Capovilla & Capovilla, 1998; Liberman et al., 1974; Torgensen, Wagner & Rashotte, 1994, cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Freitas, 2004);
  • Desenvolvimento progressivo ao longo da infância (Freitas, 2004);

  • Depende de:
    - Experiências linguísticas (Lane & Pullen, 2004);
    - Desenvolvimento cognitivo da criança (Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006);

    - Características específicas de diferentes capacidades de CF (Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006);
    - Exposição formal ao sistema alfabético, com a aquisição de leitura e escrita (Goswani & Bryant, 1990; Lane & Pullen, 2004; Maluf & Barrera, 1997; Morais et al., 1979; Morais, Mousty & Kolinsky, 1998 cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006).
  • Apesar deste desenvolvimento nem sempre ocorrer na mesma ordem, os estudos são unânimes quando referem que o nível mais complexo de CF e, portanto, a última capacidade a surgir, é a consciência fonémica (Freitas, 2004; Lane & Pullen, 2004; Sim-Sim, 1998).



Desenvolvimento fonológico

  • 1 – 2 meses
    - Distinção dos sons com base no fonema (Sim-Sim, 1998).
  • 30 meses
    - Detecção de eventuais erros na produção do seu enunciado ou no dos outros interlocutores (auto-correcções) (Sim-Sim, 1998).
  • 36 meses

    - Distinção de todos os sons da sua língua materna, pelo que consegue distinguir as cadeias sonoras aceitáveis na sua língua, corrigindo as não passíveis (Sim-Sim, 1998).
  • 3 - 4 anos
SS- Sensibilidade às regras fonológicas da sua língua (Sim-Sim, 1998);
SS- Manifestam capacidades de CF: reconhecem rimas e aliterações, identificando as primeiras (Cardoso-Martins, 1994 cit. por Freitas, 2004; Treiman & Zukowski, 1996 cit. por Freitas, 2004);

SS- Prazer lúdico com as rimas através de jogos de sons e de palavras, nas quais a criança faz deturpações voluntárias, criando palavras novas (aldrabão/trapalhão – traldrabão) (Sim-Sim, 1998);
SS- A produção de rimas é uma tarefa mais fácil, comparativamente à de segmentação de sons ou de identificação fonémica (Duncan, Seymour & Hill, 1997 cit. por Freitas, 2004);
SS- Dificuldades em identificar a palavra no contínuo sonoro, competência que é consolidada ao longo do percurso escolar (Alves, Freitas & Costa, 2007).
  • 4 anos
    - Maiores dificuldades em tarefas de consciência fonémica quando comparada à silábica (Freitas, 2004);
    - Capacidade de segmentar silabicamente unidades lexicais compostas por duas sílabas (Sim-Sim, 1998);
    - Maiores dificuldades na segmentação de palavras polissilábicas e/ou monossilábicas (Sim-Sim, 1998).


  • 5 anos
    - Capacidades metafonológicas ao nível do fonema
    e do traço distintivo, desde que as tarefas sejam adaptadas à realidade linguística e cognitiva da criança (Coimbra, 1997 cit. por Freitas, 2004).
  • 6 anos
    - Domínio, quase total, da capacidade de segmentação silábica (Sim-Sim, 1998);
    - Maiores dificuldades nas tarefas relativas à consciência fonémica, pois ainda não há o apoio da escrita. No entanto, com a aprendizagem da leitura há conhecimento adicional sobre a estrutura linguística (Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006);
    - A CF vai-se complexificando, sendo necessário receber instruções formais que explicitem as regras de correspondência dos sons da fala na escrita alfabética (relações fonema/grafema) (Jenkins & Bowen, 1994 cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006);
    - Desenvolvimento da consciência fonémica (Jenkins & Bowen, 1994 cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006).
  • A partir dos 6 anos
    - Maior desenvolvimento das capacidades metafonológicas, devido à aquisição da escrita (Freitas, 2004);
SSS- Domínio de todos os níveis de CF (Cielo, 2000 cit. por Freitas, 2004).
W

Relação entre a consciência fonológica e a leitura e escrita

sssssA capacidade de pensar conscientemente sobre os sons da fala e suas combinações assume especial relevo para a aprendizagem da leitura e escrita, que é a aquisição mais importante nos primeiros anos de escolaridade da criança. De forma sucinta, pode dizer-se que esta complexa tarefa resulta da relação entre a escrita das palavras e a oralidade, o que implica a capacidade de identificar os sons da fala (fonemas) e manipulá-los, de forma a estabelecer a relação necessária entre eles e a sua representação ortográfica (Lane & Pullen, 2004; Vale & Caria, 1997; Viana, 2006).






sssssA escrita alfabética da língua portuguesa é, essencialmente, fonémica, a qual se estabelece através do princípio alfabético da escrita: a unidade escrita (grafema) é relacionada à unidade sonora da palavra (fonemas) (Gathercole & Bradedeley, 1993 cit. por Freitas, 2004) através da reflexão acerca dos sons da fala e sua relação com os grafemas, o que, por sua vez, requer o acesso à CF (Freitas, 2004; Teles, 2004).


ssAssim, é possível compreender a existência de uma relação entre a CF e a aprendizagem da leitura e escrita, verificando-se que, durante algum tempo, os investigadores se questionaram acerca do tipo de relação que se estabelecia entre estas capacidades.



sssssAlguns autores afirmavam que a CF melhorava a leitura e escrita, refutando a situação inversa (Lundberg et al., 1988 cit. por Freitas, 2004).








sssssContrariamente, Morais, Cary, Alegria e Bertelson (1979) e Read et al. (1986) referiam que era no decorrer do processo de aprendizagem de leitura e escrita que a CF se desenvolvia (Freitas, 2004; Pestun, 2005).




sssssAlgumas destas concepções não contemplavam todos os níveis de CF, pelo que Treiman e Zukowski (1996) explicam que a consciência de sílabas, aliteração e rimas pode desenvolver-se sem o conhecimento da escrita; o mesmo não se pode afirmar para a consciência fonémica, que resulta, parcialmente, do contacto com a escrita, o que também foi confirmado nos estudos de Coimbra (1997) e Freitas (2004) (Freitas, 2004).


ss Adams (1990) e Morais, Mousky e Kolinsky (1998), numa perspectiva de reciprocidade entre a CF e a aquisição da escrita, defendem que alguns níveis de CF antecedem a aprendizagem da leitura, enquanto outros, mais complexos, derivam dessa aprendizagem, pelo que as crianças já detêm capacidades metafonológicas prévias à aquisição da escrita, desenvolvendo outras e aperfeiçoando as que já possuem através desta aquisição (Freitas, 2004; Sim-Sim, 1998).s




sssssNa mesma perspectiva, Yavas (1989) argumenta que a aprendizagem da leitura origina o desenvolvimento das capacidades metalinguísticas, as quais, por sua vez, facilitam esta aprendizagem. Para Cardoso-Martins (1991), a aprendizagem da correspondência entre a sílaba falada e a escrita contribui, possivelmente, para a consciencialização mais directa dos fonemas (Freitas, 2004).

sssssActualmente, sabe-se que há uma relação de reciprocidade e interdependência entre a CF e a aquisição de leitura e escrita. Assim, a CF facilita o processo da aprendizagem da leitura e escrita e este último processo favorece o desenvolvimento da CF, particularmente da consciência fonémica (Adams, 1990; Freitas, 2004; Morais, Mousty, Kolonsky, 1998, cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Pestun, 2005; Viana, 2006).

sssssEmbora o desenvolvimento desta capacidade se inicie desde cedo (Bradley; Bryant, 1983; Carraher; Rego, 1984; Capovilla; Capovilla, 1998; Liberman et al., 1974; Torgensen; Wagner; Rashotte, 1994, citados por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe, & Bandini, 2006) , é através da exposição formal ao sistema alfabético, com a aquisição da leitura e escrita, que se dá o aprimoramento e pleno desenvolvimento da CF (Goswani & Bryant, 1990; Maluf & Barrera, 1997; Morais et al, 1979; Morais, Mousty, Kolinsky, 1998 cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006).

sssssssAssim, a CF parte de um nível implícito, de análise de sons, para um explícito, essencial na correspondência fonema-grafema (Freitas, 2004).

ssssA adequação desta capacidade metalinguística, aquando do inicio da escolaridade, assume extrema importância, uma vez que este é um forte preditor para a aquisição e desenvolvimento adequados da leitura e escrita (Vale & Caria, 1997).

ssssEstudos mais aprofundados tentam identificar quais os níveis da CF que mais influenciam o sucesso na aprendizagem da leitura e escrita. Alguns autores referem que a consciência silábica, mais especificamente, o domínio da capacidade de segmentação e manipulação silábica, são essenciais para o sucesso na aprendizagem da leitura e escrita, devendo estar consolidados previamente à entrada na escola (Sim-Sim, 1998).

sssssContudo, estudos recentes referem que a consciência fonémica é a capacidade que melhor prediz o sucesso na aprendizagem da leitura e escrita, constituindo um pré-requisito para esta aprendizagem (Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Blachman, 1994; Bradley & Bryant, 1978 cit. por Smiley & Goldstein, 1998; Hoien et al., 1995; Hatcher & Hulme, 1999 cit. por Nancollis, Lawrie, & Dodd, 2005; Viana, 2006).
sssss

sssssTodavia, aquando da entrada na escola, as crianças demonstram maior dificuldade nas tarefas relativas à consciência fonémica, não só por serem tarefas mais complexas, mas também porque ainda não têm o apoio da escrita (Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe, & Bandini, 2006).


sssssNeste sentido, as crianças em início de escolaridade adquirem conhecimento adicional sobre a estrutura linguística à medida que decorre a aprendizagem da leitura o que favorece o desenvolvimento da CF. É essencial que as crianças recebam instruções formais que explicitem as regras de manipulação dos sons da fala na escrita alfabética (relações fonema – grafema), para promover maior desenvolvimento da consciência fonémica (Alves, Freitas & Costa, 2007; Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Bradley & Bryant, 1978 cit. por Smiley & Goldstein, 1998; Freitas, 2004; Jenkins & Bowen, 1994 cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Sim-Sim, 1998).

sssssA combinação de ambos os factores deverá culminar no domínio do princípio alfabético (Byrne, 1998; Byrne, Fielding-Barnsley, 1989 cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006).

sssssSendo um bom leitor, um bom descodificador do código alfabético e visto esta etapa ser tão importante para que seja possível atribuir um significado a um texto, o treino da CF pode ser bastante útil, facilitando a aprendizagem da leitura e escrita, acelerando-a e minimizando eventuais frustrações que possam advir desta complexa aprendizagem (Vale & Caria, 1997).





Estudos científicos


sssssA influência da CF na aquisição e desenvolvimento da leitura e escrita tem sido estudada por muitos investigadores. Estes colocaram questões e encontraram respostas fundamentadas em dados estatísticos e resultados significativos, os quais justificaram o empreendimento da investigação nesta área por várias décadas e até aos nossos dias.



sssss1. A consciência fonológica melhora o desenvolvimento da leitura e escrita?

sssEsta questão foi alvo de inúmeros estudos tendo-se estabelecido os seguintes pressupostos:


sss- É o mais estável e robusto preditor de sucesso na aprendizagem da leitura e escrita (Lonigan, Burgess & Anthony, 2000 cit por Hogan, Catts & Little, 2005);

sss- É um facilitador na aprendizagem da leitura e escrita de crianças com e sem dificuldades de aprendizagem (Ball & Blanchman, 1991; Barrera & Maluf, 2003; Bradley & Bryant, 1983; Byrne & Frielding-Barnsley, 1989; Calfee, Lindamood & Linda Mood, 1973; Capovilla, 2000; Capovilla & Capovilla, 2000 cit. por Melo, 2006; Cardoso-Martins, 1991, 1995; Cunnigham, 1990; Ehri et al., 2001; Hatcher, Hulme & Snowling, 2004; Juel, Griffith & Gough, 1986; Hatcher & Hulme, 1999 cit. por Santos & Maluf, 2007; Liberman, et al, 1974; Lundberg, Frost & Petersen, 1988; Nancollis, Lawrie & Dodd, 2005; Pestum, 2005; Scanlon & Vellutino, 1996; Vellutino & Scanlon, 1987, entre outros cit. por Bernardino, Freitas, Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Santos 2004 cit. por Santos & Maluf).




sssss2. Há diferenças entre a aplicação do treino da consciência fonológica antes ou depois do processo de alfabetização?

sssEsta hipótese foi levantada em estudos que possuíam amostras com pré e pós leitores, isto é, crianças do pré-escolar e crianças que já tinham iniciado o processo de alfabetização. As conclusões diferem entre os autores, tal como se observa nos estudos abaixo enunciados:


sss- De acordo com Schneider (1997) e Lundberg, Frost e Petersen (1998), a intervenção pode já ser realizada em crianças do pré-escolar (Santos & Maluf, 2007);

sss- Segundo Hatcher e Hulme (1999), a intervenção obtém resultados mais significativos se o treino da CF for conjugado com o ensino institucional da leitura (Santos & Maluf, 2007);

sss- No estudo de Santos (2004), o autor refere que, apesar de haver benefícios na articulação entre as capacidades metafonológicas e as actividades de ensino de leitura e escrita, tal relação é facultativa (Santos & Maluf, 2007).



sssss3. A intervenção ao nível da CF dá acesso directo ao conhecimento do princípio alfabético?

sssResultados de investigações reforçam a ideia de que o treino de CF, por si só, não permite às crianças o domínio do princípio alfabético.


sss- O estudo de Byrne e Fielding-Barnsley (1991) concluiu que o conhecimento das letras e da identidade dos fonemas são capacidades necessárias, embora insuficientes, para a aquisição do princípio alfabético (Santos & Maluf, 2007);

sss- Segundo Torgesen, Morgan e Davi (1992), o conhecimento de que as palavras são constituídas por fonemas não assegura a compreensão do princípio alfabético (Santos & Maluf, 2007).



sssss4. Todas as capacidades da CF influenciam, igualmente, a leitura e a escrita?

sssVários estudos têm procurado identificar diferenças na influência que cada uma das capacidades da CF tem na aprendizagem da leitura e escrita. Embora os resultados dos estudos não sejam unânimes, parece prevalecer a ideia de que a consciência fonémica é aquela que mais influencia esta aprendizagem.

sss- No estudo de Hohn e Ehri (1983) foram implementados dois programas de treino de consciência fonémica. Os resultados revelaram que a associação dos fonemas aos grafemas favorece a aquisição de um sistema visual símbolo-som, que é usado pela criança na distinção e representação dos fonemas (Santos & Maluf, 2007);

sss- Cunningham (1990) investigou o papel da instrução implícita e explícita no treino da CF, com o intuito de averiguar a influência das capacidades fonológicas na melhoria das capacidades leitoras. Os resultados desta investigação indicaram que as crianças podem adquirir capacidades de consciência fonémica através de ensino directo (explícito) e que a consciência fonémica influencia as capacidades de leitura (Santos & Maluf, 2007);

sss- Wise, Ring e Olson (1999) revelaram que as metodologias que contemplam, não só a manipulação dos sons, mas também a consciência articulatória (atenção explicita à articulação), resultam em melhorias mais acentuadas na leitura e escrita, comparativamente a metodologias que contemplem apenas uma área (Santos & Maluf, 2007);

sss- De acordo com o estudo de Cardoso-Martins (1996) concluiu-se que a aliteração contribui para a aprendizagem da leitura e da escrita. Por outro lado, a sensibilidade à rima, aparentemente, não exerce um papel fundamental no domínio do princípio alfabético, por parte das crianças brasileiras (Melo, 2006);

sss- Goswami & Bryant (1997) postularam que a capacidade para detectar rimas e aliterações são factores preditivos do sucesso na aprendizagem da leitura e escrita (Nascimento, 2009);

sss- Diferentes autores consideram que a análise fonológica, ao nível da sílaba e em tarefas de aliteração, assumem uma importância particular na aquisição da leitura e da escrita (Capovilla, Colorni, Nico, & Capovilla, 1995; Correa, 1997; Correa, Meireles, & Maclean, 1999; Maluf & Barrera, 1997 cit. por Melo, 2006).



sssss5. A influência da CF na melhoria da leitura e escrita também se aplica a casos de insucesso escolar ou a crianças com deficiência?

sssEstudos comprovam que existem benefícios no treino desta capacidade em casos de insucesso escolar e em determinadas patologias, como Trissomia 21, Dislexia e Perturbações Específicas do Desenvolvimento da Linguagem.

sss- Cardoso-Martins (1996) empreendeu um estudo em que era trabalhada a capacidade de detecção de rimas em crianças e adultos com e sem Síndrome de Down, tendo-se concluido que para ambos os grupos a capacidade de identificação do fonema inicial foi benéfica para a aprendizagem da leitura e escrita (Santos & Maluf, 2007);

sss- Estudos conduzidos por Cárnio e Santos (2005) revelaram que a intervenção ao nível da CF, mesmo em casos de insucesso escolar grave, melhora significativamente a leitura e escrita (Santos & Maluf, 2007).

Trabalho em equipa

Terapeutas da Fala (TF) - Professores: Relação de cooperação

  • O TF deve colaborar com os professores no aumento da instrução da CF no currículo geral de educação, de forma a alcançar um maior sucesso em situações de dificuldades nesta área (Nancollis, Lawrie, & Dodd, 2005; Schuele & Boudreau, 2008);

  • O TF pode auxiliar os professores na selecção de instruções e estratégias adequadas, de acordo com as necessidades de aprendizagem de cada grupo/criança (Schuele & Boudreau, 2008).

Considerações no treino da consciência fonológica


  • A CF é muito importante para a aprendizagem posterior da leitura e da escrita, pelo que a implementação de estratégias promotoras desta capacidade é essencial, tanto em contexto de jardim-de-infância como nas escolas de 1º ciclo (Viana, 2006);
  • É essencial que os educadores/professores conheçam as principais etapas do desenvolvimento da CF, através do contacto com um TF, para poderem mobilizar as estratégias pedagógicas mais eficientes para compensar défices de CF previamente existentes nas crianças, evitando o insucesso escolar (Alves, Freitas, & Costa, 2007; Schuele & Boudreau, 2008; Viana, 2006);
  • Em idade pré-escolar é importante desenvolver actividades de discriminação auditiva, rimas infantis e contos rimados, pois permitem trabalhar, de forma lúdica, a CF, o vocabulário e a memória auditiva. Com estes jogos, as crianças começam a reflectir sobre a estrutura da linguagem oral e a analisar a língua nos seus constituintes sonoros: discurso – palavras – sílabas – fonemas (Alves, Freitas, & Costa, 2007; McLean, Bryant & Bradley, 1987; Viana, 2006);
  • As actividades realizadas em grupo aumentam a curiosidade, participação e interesse das crianças (Yopp, 1992);

  • A ponte para os símbolos gráficos deve ser efectuada quando as crianças identificarem as sílabas e fonemas na oralidade (Alves, Freitas, & Costa, 2007);

  • A colaboração entre o professor e o TF é crucial, para se adaptar correctamente os exercícios aos alunos a quem se destinam e aumentar gradualmente a sua complexidade, no que respeita ao grau de dificuldade dos exercícios e estímulos linguísticos (Alves, Freitas, & Costa, 2007; Schuele & Boudreau, 2008).

Sinais de alerta


  • Fonologia - Crianças com alterações severas ao nível da fonologia apresentam um desempenho inferior às da sua idade em tarefas de CF, principalmente em tarefas de soletração, pelo que há maior risco de ocorrência de dificuldades na aprendizagem da leitura (Clarke-klei & Hodson, 1995; Smiley, 1977 cit. por Smiley & Goldstein, 1998; Stackhouse, 1997 cit. por Smit, 2004).
  • Articulação - Crianças com perturbações articulatórias apresentam, geralmente, maior probabilidade de iniciarem a escolaridade com capacidades fonológicas atrasadas, o que influencia a aprendizagem da leitura e escrita (Raitano, Pennington, Tunick, Boada & Shriberg, 2004; Rvachew, Ohberg, Grawburg & Heyding, 2003; Webster, Plante & Couvillion, 1997 cit. por Rvachew, Chiang & Evans, 2007).
  • Meio Socioeconómico - Crianças que vivem em meios socioeconómicos desfavorecidos exibem menor sensibilidade à estrutura fonológica da linguagem, pelo que apresentam níveis de realização de leitura inferiores às das provenientes de meios sociais mais favorecidos (Bowey, 1995 cit. por Gamelas, Leal, Alves, & Grego, 2003; Gamelas, Leal, Alves & Grego; 2003).

Bibliografia

  • Alves, D., Freitas, M. J., & Costa, T. (2007). PNEP - O conhecimento da Língua: Desenvolver a consciência fonológica. Lisboa: Ministério da Educação
  • Bernardino, J. J., Freitas, F. R., Souza, D. G., Maranhe, E. A., & Bandini, H. H. (2006). Aquisição da leitura e escrita como resultado do ensino de habilidades de consciência fonológica. Revsita Brasileira de Educação Especial , pp. 423-450.
  • Bernstein, D. K., & Tiegerman-Faber, E. (2002). Language and Communication Disorders in Children. Allyn and Bacon.
  • Duarte, I. (2000). Língua Portuguesa: Instrumentos de Análise . Lisboa: Universidade Aberta.
  • Freitas, G. C. (2004). Sobre a consciência fonológica. In R. R. Lamprecht, Aquisição Fonológica do Português: Perfil de Desenvolvimento e Subsídios para a Terapia (pp. 177-192). Porto Alegre: Artmed.
  • Gamelas, A. M., Leal, T., Alves, M. J., & Grego, T. (s.d.). Contributos para o Desenvolvimento da Literacia: Clube de leitura. Obtido de http://www.casadaleitura.org/portalbeta/bo/documentos/ot_clube_leitura_a.pdf
  • Hogan, T. P., Catts, H. W., & Little, T. D. (Outubro de 2005). The relationship Between Phonological Awareness and Reading Implications for the Assessment of Phonological Awareness. Language, Speech and Hearning Services in Schools , pp. 285 - 293.
  • http://office.microsoft.com/pt-pt/clipart/default.aspx?ver=12&app=winword.exe
  • Lane, H. B., & Pullen, P. C. (2004). A Sound Beginning: Phonological Awareness Assessment and Instruction. USA: Pearson Education, Inc.
  • Lopes, F. (Dezembro de 2004). O desenvolvimento da consciência fonológica e sua importância para o processo de alfabetização. Psicologia Escolar e Educacional , pp. 241-243.
  • Maluf, M. R., Zanella, M. S., & Pagnez, K. S. (2006). Habilidades Metalinguísticas e linguagem escrita nas pesquisas brasileiras. Boletim de Psicologia , pp. 67-92.
  • Mateus, M. H., Falé, I., & Freitas, M. J. (2005). Fonética e Fonologia do Português. Lisboa: Universidade Aberta.
  • Melo, R. B. (2006). A relação entre consciência fonológica e aquisição da leitura e da escrita de jovens e adultos. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  • Moreira, V., Pimenta, H., & Marques, M. A. (2008). Gramática de Português. [s.l.]: Porto Editora.
  • Nancollis, A., Lawrie, B. A., & Dobb, B. (Outubro de 2005). Phonological Awareness Intervention and Aquisition of Literacy Skills in Children from Deprived Social Backgrounds. Language, Speech and Hearing Services in Schools , pp. 325-335.
  • Nascimento, L. C., & Knobel, K. A. (2009). Habilidades Auditivas e Consciência Fonológica: da teoria à prática. São Paulo: Pró-Fono.
  • Nunes, C., & Frota, S. (2006). Audio Training: Fundamentação teórica e prática. São Paulo: AM3 Artes.
  • Pestun, M. S. (2005). Consciência fonológica no início da escolarização e o desempenho ulterior em leitura e escrita: estudo correlacional. Estudos de Psicologia , pp. 407-412.
  • Rohl, M., & Pratt, C. (1995). Phonological awarness, verbal working memory and the acquisition of literacy”. Reading and Writing: An Interdisciplinary Journal , pp. 327-360.
  • Rvachew, S., Chiang, P.-Y., & Evans, N. (Janeiro de 2007). Characteristics of Speech Errors Produced by Children With and Without Delayed Phonological Awareness Skills. Language, Speech, and Hearing Services in Schools , pp. 60-71.
  • Santos, M. J., & Maluf, M. R. (Janeiro-Junho de 2007). Intervenções em consciência fonológica e aprendizagem da linguagem escrita. Boletim Academia Paulista de Psicologia , pp. 95-108.
  • Schuele, C. M., & Boudreau, D. (Janeiro de 2008). Phonological Awareness Intervention: Beyond the basics. Language, Speech and Hearing Services in Schools , pp. 3-20.
  • Sim-Sim, I. (1998). Do uso da linguagem à consciência linguística. In I. Sim-Sim, Desenvolvimento da Linguagem (pp. 225-236). Lisboa: Universidade Aberta.
  • Smiley, L. R., & Goldstein, P. A. (1998). Language Delays and Disorders: From Research to Practice. San Diego: Singular Publishing.
  • Smit, A. B. (2004). Articulation and Phonology Resource Guide for School-Age Children and Adults. Nova Iorque: Thomson Delmar Learning.
  • Vale, A. P., & Caria, T. H. (1997). O uso racionalizado da cultura: o caso da relação entre a consciência metafonológica e a aquisição da leitura. Educação, Sociedade e Culturas , pp. 45-72.
  • Viana, F. L. (2006). As rimas e a consciência fonológica. Promovendo a competência leitora., (pp. 1-11). Lisboa.
  • Winson, B. (2007). Language Disorders Across the Life Span. USA: Thomson Delmar Learning.